Não sei se consigo contentar-me, arrogantemente, apenas com as palavras.
Poderei apenas fazê-lo assim: escrever ou dizer palavras, mas, ao fazê-lo, elas transformam-me imediatamente num ator, num protagonista, acabarão por me conduzir a um contexto determinado, a mim e a todos aqueles que possam ler ou ouvir. Uma coisa está conexa com a outra, e este é um dos grandes dilemas da palavra. Outra coisa bem diferente é a verdade factual que as palavras no permitem traduzir aquilo que acabamos por ver. E também, outra coisa bem diferente, a palavra permite-nos, no meio de um turbilhão de árvores que escondem a floresta profunda, revelar os nossos sentimentos mais profundos e íntimos, penetrando até às nossas emoções, despertando toda uma gama de desejos que enchem o nosso coração de orgulho.
Rir, meditar, desejar, falar, são tudo realidades que para se completarem têm que ter a proximidade corporal a quem desejamos, sentir o seu odor, os seus ínfimos pormenores, sem esquecer aquilo que parece ser o seu olhar com que nos mira, a admiração, o deslumbramento que nos causa quando a olhamos atenciosamente, e não é preciso que o seja na intimidade, uma simples visão dela a esvoaçar, complementada com as suas graciosas formas e a sensualidade que lhe é caraterística, é, por si só, o bastante para ficarmos rendidos a ela, nesse nosso olhar, que não se cansa nunca de admirar, sobre todas as suas belas formas corporais e que nos permitem desejar avistá-la o mais perto possível.
Uma borboleta passou agora mesmo à minha frente, solitária, colorida, com o seu voo que parece precário, mas capaz de percorrer grandes distâncias, e é essa borboleta que acaba por me revelar essa visão que acabo de ter.
Que fim terá essa borboleta? Chegará a emocionar outra alma? Contudo, ela acaba por desaparecer no meio da paisagem que me rodeia. Via-a, é certo, parecia que a tinha na mão, mas esvoaçou, foi-se, e afinal nunca a tive na mão, mas ao alcance de um olhar.
Ficam-se, então, as palavras desse encontro fortuito com a borboleta!