A SURPRESA QUE ACABOU ME SURPREENDENDO
Na mesa jaz o cadáver
Pronto
Para o legista o examinar
O dissecar
E perceber, enfim, a causa da morte daquele homem!
Não te vou perguntar
Nem sequer dizer nada
Que não saibas já o que dizer
E quando dizer
Quando o assunto for a morte deste homem.
O bisturi inicia o corte
Ceifa, ponto por ponto,
Aquele corpo cansado da vida, antes vivo, ora morto
E quando o corte vai para além da epiderme
Eis que palavras se soltam
E, pouco a pouco se vão completando,
Como se fosse um ataque de flatulência,
Frases que se complementariam
O poema acabado de nascer
Nasceu…
E eu, feliz, que aqui regresso sempre
Ao poema, às palavras
Meu vício, minha vida
E mesmo depois da morte, espero continuar nas palavras
Falando do que não falei enquanto vivi
Para regressar sempre ao poema, às palavras, com ou sem acento
Mas com virtude e não defeito
Para que a vida e a morte não tenham sequer uma qualquer interrupção
Mas estejam ligadas às palavras que brotam suaves e empolgadas
Ao poema, deste ou doutro,
Para regozijo de todos os que têm na palavra a sua fé!
E o legista termina o seu trabalho
Dissecando o corpo
Limpando o sangue
Acaba guardando as vísceras, pesando os órgãos
Coze, por fim, o corpo
Eis, então, o homem que jaz na cama da morgue dizimado pelo bisturi
Limpo, leve e pronto para receber a nova morada!|
E o poema completou-se, terminou,
É tempo de mostrar a sua luz
Aos demais!