NÃO TE DISTANCIES TANTO MAS ESCREVE POR FAVOR
Branca página
De desespero
Branca neve
De serenidade
Brancas rosas
De pura alva matinal!
Limbo esperançoso que tranquiliza a minha alma
Página em branco
Que se assoma ao ecrã
À espera que os neurónios se iluminem
E abarrotem de figuras negras o branco da página
Como se fosse um cenário polar
E as palavras, aqui e ali, que vão surgindo,
Aves famintas que esvoaçam
E grasnam
Em simultâneo
No silêncio glacial;
Frase profunda, sentida
Evoca a expressão do olhar
Que antevejo nas tuas palavras
Ideias que te desassossegam
Imagens que não quero perder de vista.
Palmilho esse mesmo caminho que escolheste
A doçura dos teus lábios descerrados
Que rogam beijos suaves, entusiasmados, arrebatados
Pequenas marcas das tuas pegadas
Ideias que se completam, intemporais,
Uma inspiração capciosa que bule
Até com a serpente nos longos invernos do hemisfério norte.
Não quero deixar-me guiar pelo engano
Que amolece os cristais
Sigo o instinto, a gratidão, a rebeldia
A largueza, a frontalidade, a revelação
Diante da página em branco
Que depressa se completa com a abundante monção
Das palavras, das emoções, dos desejos, dos afetos
Água ávida e abundante corre no solo
Impregnando de um forte odor a terra
Acabo rendido à paz quando leio o que escrevo;
Mas desespero-me e exaspero-me
Afinal porque escrevo? E para que escrevo?
Afinal, escrevom escrevo tanto
Mas, afinal,
Não consigo dizer-te o que te quero realmente dizer
Nesse branco polar
Que é o ecrã do meu computador
Quando nu se apresente
Sem os vorazes e voadores pássaros;
Falsidade imerecida
Que me concede a inusitada constelação da realidade
A perfídia que me entedia
Encolhe-me, enruga-me, desespera-me, imola-me
Não fico em paz mas não tenho vontade de guerrear
Escrever, escrever, escrever
Se for feito de paixão e empolgamento
Pode cegar-me
Pode distorcer-me da dita realidade
Do comum dos mortais
Posso até sucumbir a ela…
Mas como poderei fazer
Para não sucumbir à realidade?
Deixar de escrever? Morreria certamente por dentro!
Deixar de amar? Esfumar-me-ia obviamente!