NESSA TUA VOZ
Que até mim me chega diariamente Através das tuas palavras Escritas em proféticas aparas De escuras páginas Pontuadas de palavras Que são como o céu escuro da noite Repleto de estrelas coladas ao firmamento As tuas palavras abastecem-se das minhas Lavradas em fundo branco Como se fosse uma imagem polar Mas no meio destas palavras criativas Os ursos são perseguido pelas focas As raposas são presas fáceis do tempo E as palavras são, então, aves multiformes Que esvoaçam sem rumo Próximas às cabeças dos homens Que se aventuram Na mescla camada de neve e gelo Que ajuda a temperar as minhas palavras! Trazes na tua mão Uma taça multicolor Como se fosse um arco-íris Onde seguras a tua vontade Com a força das palavras empolgadas Do sal, desse sal, que escorre Da água Da bruma que te protege Dos olhares que tanto te ferem Dos olhos negros que só enganam Quem se deixa enganar Da tua cútis enegrecida Salpicada das cicatrizes Que, vida empolgada, Te acabou por conduzir Dessa inclemente desproporção Dos que, afinal, gostam das palavras Porque apenas gostam de nós Mas afinal o que te restam são palavras São fortes sentimentos E é aí onde mergulhas com todo o teu ser e elegância Onde não temes nunca a força do mar A fúria das suas marés E onde nunca te sentes só Porque a lua estará sempre ali Para te deixar sair dessa obscura sombra Que esse teu mistério Não se cansa de celebrar nunca Em cada palavra que escreves Nesse céu negro de que te serves Para comunicares ao mundo O teu incondicional amor às palavras E a quem as profere De modo tão suave E esplêndida maneira De as dizer… ### Entrego-te em mãos Taça multicolor Arco-íris Bebo-o cor a cor E derrama os últimos pingos Na tua alma que escreve Quebra a taça Deixa-a partir-se Na confusão de um Diabo Que enreda-se em artimanhas Para querer derrubar Almas que não o seguem Solta palavras Nessa tua neve sê humilde Que a humildade quer-se cor Em ideias com sentidos Cativas-te tu, cativas o outro Escreve, organiza, orienta Dá sentido, questiona E tantos arco-íris em taças Beberas E palavras tuas serão amenas Majestosas no escuro.
Escrito a quatro mãos por: ETAN COEHN
e
SANDRA (https://cronicassilabasasolta.blogs.sapo.pt/
Alma acolhedora
Benigna sentinela
De coração selvagem
Atropela-se
Mas acaba fluindo
O que no seu interior
Vai fervilhando como lava
E as flores,
Mesmo tão próximas do vulcão,
Vermelhas da cor do fogo
Medram viçosas
Mesmo tão frágeis
Mas flores há
Que no campo
Irradiam felicidade
Mas isso é apenas pura ilusão!
Celebra Amiga
Rejubila
Canta
Até que a voz
Que para tão longe se foi
Regresse,
Como as cinzas à jarra,
Donde se havia esgueirado
Num dia em que a música
Se ausentou, de vez, da tua vida
E te ficou apenas um vago desejo de cantar
Gritos que se enchem de preces vingativas
Saem dos lábios descerrados
Do homem
Que acha que lhe pertences
Como se fosses um objeto
E os gritos tolhem-te a vontade
Deixam-te silenciosa e aterrorizada
Mas esperançosa
Que ele te ame tanto
E não acabe ceifando atrozmente a tua vida;
Eis-me, pois, nesta fresta da muralha medieval
Para aqui anunciar ao mundo
Ondo costumo ouvir o vento
E onde presto toda a minha atenção
Para ouvir este vento
Que se movimenta ciclónico
Em fúria
Brutal
E assassino
Que te lançará nos caminhos da destruição!
Aguardo que as tuas mãos deslizem pelo papel
Desenhando com essa caligrafia arredondada
As luzes e as sombras
Que a obra a quatro mãos exige
Renega ao teu nome
Dispersa as histórias
Que são a história da tua vida
Sê frugal, mas não simples
Abjura à pátria
Mas não renegues ao amor
Não fujas dele covardemente
Não abomines o ridículo
Não exorcizes a maldição
O que disseres
O que fizeres
Rasgará as nuvens
E a estrela iluminará os céus mais enegrecidos
E a água cristalina do oceano
Refletirá o azul vivo do céu sem nuvens
E se planteará, perante, as linhas que,
Como escadas,
Darão a frase e o mote
Donde brotará o poema
E os dedos longos fazem-se às teclas
E os meus pensamentos
Procuram os teus
E os teus
Os meus!
Mas, afinal, homem cruel, porque mataste?
Porque abateste
Aquela a quem dedicaste
Tantas palavras
Tantos versos
Tantas juras?
Podias, ao menos,
Ter-lhe dado morte mais corporal
Uma faca, por exemplo?
Mas escolheste coisa tão vil
Uma bala que lhe trespassou o coração…
Mas alguns ainda dirão:
Ele era muito amigo dela
Amava-a tanto
Que acabou por não resistir…
Mas está arrependido?
Ó se está
Ó se está...
Um pobre diabo
Coitado!
NOTA: Na impossibilidade de identificar uma a uma, como se fosse um extensíssimo mural, cada uma das mulheres que foram assassinadas por motivos fúteis pelos maridos em Portugal e no mundo, dedico, a todas elas , este sengelo mas sentido poema.
Deixa-me dizer-te
A ti que me lês
Com tanto interesse
Curiosidade
Ou até por comiseração
Mas a ti, também, que me lês fugazmente
Que olhar o Sol
Não basta
Para o encantares
Para o decifrares
Para o teres na mão…
Se o olhares
mas se te decidires cumprimentá-lo
E se, ainda, te dispuseres louvá-lo
Dás-lhe força
Dás-lhe majestosidade
Dás-lhe primazia
E assim ele se sentirá
A estrela
Que não te abandonará jamais!
E, assim, o Sol
Não precisará de lançar
A sua língua de fogo
Acompanhada
De punitiva lavareda
Mas dar-te-á o calor e a luz
Que tanto precisas
Sobretudo para não esmoreceres nos dias de inverno mais frios
Como se fosses um simples cardo do monte
Que a tudo renuncia
Até a companhia de cintilantes flores
Crescendo solitária
E tudo para que a sua roxa flor
Não vá parar a uma jarra
Mas acabe a coagular o leite de cabra.
E o Sol temperado
Aplacará a ira
Da esfinge silenciosa
Mortífera
Traiçoeira
Que os gregos tanto temiam.
Mas, Sol,
Dá-me a luz
A força das palavras
O sentir forte o meu coração
Para que a mensagem
Chegue até ti
Derrube os muros que ergueste e que te cercam
E que te cristalizaram na solidão
Da infância em que, todavia, vives
E te recusas a sair
Porque tens tanto medo
Tanto receio
Tanto pavor
Que,
Achas,
Só cavalgando um elefante nas suas imponentes ancas
Ele te protege do tigre
Mas a tua defesa é
Lidar com os males que há no mundo!
E não há retângulos, quadrados ou áreas circulares
O que há são imagens na nossa cabeça
Sem formas, sombreadas,
Que nos podem abalar
O que há são manias
Que nos podem perseguir
O que há são vozes
Que parecem
Ditames ou vontades de Belzebu…
Branca página
De desespero
Branca neve
De serenidade
Brancas rosas
De pura alva matinal!
Limbo esperançoso que tranquiliza a minha alma
Página em branco
Que se assoma ao ecrã
À espera que os neurónios se iluminem
E abarrotem de figuras negras o branco da página
Como se fosse um cenário polar
E as palavras, aqui e ali, que vão surgindo,
Aves famintas que esvoaçam
E grasnam
Em simultâneo
No silêncio glacial;
Frase profunda, sentida
Evoca a expressão do olhar
Que antevejo nas tuas palavras
Ideias que te desassossegam
Imagens que não quero perder de vista.
Palmilho esse mesmo caminho que escolheste
A doçura dos teus lábios descerrados
Que rogam beijos suaves, entusiasmados, arrebatados
Pequenas marcas das tuas pegadas
Ideias que se completam, intemporais,
Uma inspiração capciosa que bule
Até com a serpente nos longos invernos do hemisfério norte.
Não quero deixar-me guiar pelo engano
Que amolece os cristais
Sigo o instinto, a gratidão, a rebeldia
A largueza, a frontalidade, a revelação
Diante da página em branco
Que depressa se completa com a abundante monção
Das palavras, das emoções, dos desejos, dos afetos
Água ávida e abundante corre no solo
Impregnando de um forte odor a terra
Acabo rendido à paz quando leio o que escrevo;
Mas desespero-me e exaspero-me
Afinal p orque escrevo? E para que escrevo?
Afinal, escrevom escrevo tanto
Mas, afinal,
Não consigo dizer-te o que te quero realmente dizer
Nesse branco polar
Que é o ecrã do meu computador
Quando nu se apresente
Sem os vorazes e voadores pássaros;
Falsidade imerecida
Que me concede a inusitada constelação da realidade
A perfídia que me entedia
Encolhe-me, enruga-me, desespera-me, imola-me
Não fico em paz mas não tenho vontade de guerrear
Escrever, escrever, escrever
Se for feito de paixão e empolgamento
Pode cegar-me
Pode distorcer-me da dita realidade
Do comum dos mortais
Posso até sucumbir a ela…
Mas como poderei fazer
Para não sucumbir à realidade?
Deixar de escrever? Morreria certamente por dentro!
Deixar de amar? Esfumar-me-ia obviamente!
Nostalgia que me invade
Ficção ou narrativa
Que contextualiza
O génio ou o louco
Que comigo coabita?
Pululo de sonhos e desejos
Que acabam por apagar
Alguns dos momentos tristes que já vivi…
Condenso
Ainda mais o olvido
Palavra tão bela
Suave
Musical mesmo
Suprema que está de termo
Tão excessivamente complexo
Agnóstico mesmo
E que quebra a minha relação com deus
Se é que alguma vez a tive:
Esquecimento;
Ambas são pura essência da alma
Do que ela quer, do que ela não quer,
Olvidar
É o que não quero eliminar
Dói-me tanto
Mas desafia-me sempre
É ferida aberta que não sara
Esquecer
É mais mecânico
Mais conforme o preceito, o cânone
Da racionalidade
Do mundo cibernético
Está mais para a palavra delete
E quer mesmo apagar da nossa vida!
Esse caminho que eu tantas vezes palmilhei
Rodeado de vegetação
Das borboletas que flutuavam no ar
E que pareciam posar para mim
Dos pássaros que estavam mais ao meu alcance
Que se embrenhavam pelo meio da vegetação
De galho em galho
Cantando bonitas melodias
Do som das pinhas que ia caindo no solo
Mesmo na minha frente
E que eu chutava deliciado para longe
Nesse passadiço em que o tempo
Mascarado de terra batida
Ia temperando o caminho com ervas odoríficas
Mas todo esse espaço ardeu
E, com ele, muitas das memórias esvanecerem-se
Outras conservo-as todavia
Há uma que não me saí da cabeça
Mais do que imagem
O som que ao longe
Soava do chiar mecânico das rodas em madeira
Dos carros de bois
E do olhar submisso, assumidamente humilde,
Dos lavradores que acompanhavam a junta de bois
Que puxava o pesado carro
E que quando se cruzavam comigo
Acompanhados daquele pau de marmeleiro
Fino e pontiagudo
E na extremidade sobrava um ferrete
Um sinal de uma certa rusticidade mais selvagem
Tiravam o chapéu em sinal de respeito
Faziam aquela vénia subserviente
Para o menino de calções
Que brincava deliciado no meio do mato
E que ia aprendendo, aos poucos, a ser homem!
E que dizer das tardes de verão?
Intermináveis, insuperáveis, insubstituíveis
Os rios, esse espelho da natureza,
Onde tantas vezes pesquei
Exalavam a lodo, a hortelã, a odores anisados
E a palha
Sempre presente seca e arrebitada
Mais longínqua
Mas desse tempo sobrevém sempre
Essa figura paterna
Que vive dentro de mim
E que só se extinguirá
Quando a chama
Que trago dentro de mim
Planamente se consumir!
Amoras silvestres
Visitam-me amiúde
Regressam desde o passado longínquo
Onde vislumbro o pó
E já não a essência
Do corpo que se dividiu
Passado sem regresso
A ele não poderei voltar
Da forma com o vivi
Onde
Tudo era lento, postergado e preanunciado
Não havia tanta vontade
Tanta obsessão pelo ter
Nem espaço sequer para o ser
E o desejo era uma miragem
Latente e opressivo
A Fé substituía e entorpecia qualquer esboço de desejo…
Nesse tempo
A animosidade estava ausente
A cobiça palavra apenas
E eu esticava as finas mãos
Penetrando nos silvados
Compartilhando a disputa com os melros
Queria apenas colher amoras silvestres
Guardadas pelos espinhos
Enchia ávido de amoras
A minha boca adocicada
E ficava-me com as minúsculas grainhas
Que envolvem a polpa das amoras,
Nesse tempo ansiava
Por um país moderno e sofisticado
Mas o que tinha eram amoras silvestres
Espinhos…muitos espinhos…
E nada mais
Ergueu-se há muito monumento à ignorância
Grassava
A simplicidade campestre
A pobreza espiritual
Nesse país
Nesse tempo
Tudo era cinzento
E manifestamente comediante
Ninguém sabia rir
Todos eram excessivamente sérios
Não pela vontade mas pela imposição!
Hoje há revivalismos sobre o passado
Por vezes demasiado hiperbólicos
Até uma simples descrição de uma colheita de amoras
Nos remete até uma saudade
Que acaba destilando gotículas de saliva
A minha primeira colheita de amoras
Acabou misturada com açúcar
Foi a minha primeira sobremesa a sério
Que, todavia, recordo
Na companhia de um idoso
Jovial e generoso como ninguém
Que, em permanente entorpecimento alcoólico,
Acabou por perecer, afogado, nas águas de um ribeiro
E ouvi-o tantas vezes declamar o adágio popular:
- Sopas de vinho não embebedam…
Mas é no pó que vou aspirando
Que me vem do sótão da memória
Que evoco todos aqueles com quem brinquei
Aguardar-me-ão
Pelo reencontro
Renovando os votos
Para voltar a ser feliz
Ludibriando a tristeza sentida pela ausência
Saciando a sua vontade com a minha presença
Brincando alegres e candidamente
Como as crianças
Que fomos outrora!
Cadenciado movimento
Que se move vagaroso e apaixonado
Mão de mulher
Agarra firme
A península do meu corpo
Fonte indomável do meu desejo
Que o endurece
Que o deseja
Tanto…
Persegue-o indomável
E quando o segura, plena de firmeza,
Agarra-o com determinação e orgulho
Como se tivesse o mundo na mão!
Finas e esdrúxulas “bragas”
Que diariamente envergas
Onde escondes os recantos da tua gruta
Essa mesma tão desejada;
As tuas pernas
Longas, retilíneas e perfeitas
Evocam-me os cadernos de linhas
Paralelas e contínuas até uma das margens
E que continuavam na linha seguinte
Onde as crianças escrevem as primeiras vontades
E rabiscam os primeiros desejos;
Mas,
Por mais próximas
Estou sempre a desejá-las
A requerê-las
Excitadíssimo
Cândido
Irremediavelmente perdido
Caído pelas alquebras modelares
Dessa ossatura longa e pontiaguda
Que te fazem medrar
A olhos vistos
Perante o meu deslumbrante olhar
Submerso aos vislumbres
De um desfilar perante mim
Desse teu corpo…
E de cada vez que retiro a tua roupa mais íntima
Essa que envergas sempre
Até aquele vestido que vestes pela cabeça
Arrojadamente tão curto
Que simplesmente encobre as entranhas mais íntimas
Quero sempre fazê-lo
Com a lentidão de uma locomotiva a carvão
Com a frescura dos prados Açorianos
Com a pureza da água de uma nascente
E esse desfiar de sentimentos
Tão fortes e empolgados
Que vou testemunhando em mim
De cada vez que evoco os momentos íntimos contigo
Que tive, que tenho ou mesmo que possa via a ter
Acaba, me concedendo, o clímax perfeito
Da dimensão e da magnitude
Do que realmente significas para mim!
A garupa
Não o faz por menos
Não se limita a deambular pelas águas agitadas
Perscrutando,
De olhar de predadora,
Onde estão as espécies
Que atraem a sua insaciável cobiça
Nas águas escuras e agitadas do atlântico.
A garupa
Deambula
Procura
Sustém a respiração
Oculta-se
Para logo atacar com violência
Sem dó nem piedade
Tragando
Com aquela bocarra enorme que a natureza lhe concedeu
As presas que ela identifica
Como comestíveis!
A rapariga,
Vá-se lá saber porquê,
Foi-lhe dado o nome de Silenciosa
Ávida de mostrar ao mundo
As formulações poéticas
Que saem dentro de si
Intrinsecamente complexas e densas;
Levita pela blogosfera
Munida de martelo na mão
Daqueles que conseguem sulcar os mais duros veios da pedra
Destruindo paredes e esculturas multiformes
Porém,
Destruir à bruta e desalmadamente
Não se coaduna com quem
Se quer apresentar ao mundo
Plena de cultura e de sapiência
Assim, Ela, ou é afinal bruta por natureza,
Ou faz-se e se o faz é porque se quer regenerar de alguma coisa, será?
É certo que as suas investidas
Acalmam a sua ira, a sua frustração
e até, no limite, podem ser criativas para a própria;
Ela
Adora destruir, sulcar, reduzir a pó
O que se lhe atrevesse à sua frente
Rindo-se febrilmente
Dos mais frágeis que são apanhadas nas suas garras…
Pode até ser o que a rapariga quiser
E necessitar de ser naquele momento
Desde que o risco da boa convivência
Não seja pisado e ultrapassado;
Desde logo,
E como uma marca que é indelevelmente reconhecida por todos:
O respeito pelo que os outros elaboram e constroem
Lendo muito bem também o que escrevem sobre nós
Colocando-nos sempre numa posição
Que não nos cegue com a soberba
Do nosso próprio olhar
Mas apreendendo com o olhar dos outros sobre nós!
E quando a obra começa a fazer sentido
A descobrir-se a sua essência mais ou menos controversa
Até, na sequência do seguimento perfilhado pela língua latina,
O próprio género de quem escreve:
Feminino e masculino
Pois o neutro desapareceu da língua portuguesa,
Eis que surgem os arautos
Que perscrutam e perseguem
Nas águas turvas e profundas
As espécies mais fragilizadas
Ou as que ali são obrigadas a posicionar-se
Porque a linguagem e a comunicação das espécies
Ali, naquele local tão profundo do oceano,
Onde a pressão é de facto um problema
Faz destes predadores
Seres que estão prontos a apoucar o que fazemos;
Mas quando a nossa obra
Nos concede um certo contentamento e orgulho próprio
Até pelas palavras que os outros vão tecendo sobre nós
Dos muitos que nos visitam
Pergunto:
Onde estão essas espécies que pescam na profundidade?
No medo?
Na ira?
Na vingança apenas?
Pois…
Parece que Ela, então, está à espera do nosso próxima percalço:
Fragilidade
Confissão
Ou esquecimento de algo
Para se posicionar como predadora que é
Que se alimenta destes enredos
E que circula
Livremente
E como é difícil agarrá-la
Como difícil é sempre agarrar as pérfidas e oleosas enguias
Apoucando-nos sem réstia de piedade!
Entretanto, a garoupa
Nas profundezas do mar
Acaba tragando um pobre e temerário sargo
Que se atreveu a nadar nas águas mais próximas!
Desta Paz
Que aqui vos trago
Que aqui vos falo
E falarei sempre
Que a vontade, a minha, a queira evocar
Para vos desafiar a Nela refletir
Sim porque não é pelo facto
De não se anunciarem guerras
Neste espaço peninsular
Que não devemos pensar na Paz
E na guerra também
Que, ainda não há muito tempo,
Aqui ao lado em Espanha,
Foi fratricida!
Falo sobre a Paz para não vos olvidardes
Mas falo sobre Ela também
Para vos desafiar a com entusiamo a seguir
E a sobre Ela discorrer
De modo apaixonado, civilizado mas com empolgamento
Modesto também, mas suficientemente seguro, da importância
Da enorme e gigantesca importância que tem a Paz
Nas pessoas de nobre índole
Homens e Mulheres que fazem
E que querem fazer muito pela Paz!
Modesta designação
Para conceito tão importante
Mas é de três letras que falo
Quando a Paz é a discussão!
Atribuo-lhe uma áurea esplendorosa
À Paz
E tão primordial nas nossas vidas
Que ergo essa primeira letra
Com um sentido de respeito
Que esse primeiro som
Serve-se trajado de maiúscula
Porque a Paz é mesmo uma instituição…
E tão curta é a Paz
Mas tão facilmente pronunciável
Que depois de proferida
Fica a pairar no ar
O som da última letra
Que parece um grito
Proferido nas montanhas Rochosas
Que se prolonga indefinidamente pelo ar
Como se fosse um eco gigante
Para nos lembrar como é essencial
Manter viva a chama
Que arde segura e sedenta
Para iluminar o monte Olimpo
Nesse monte onde vivem
Todas essas divindades clássicas da cultura grega
Que, a nós, que temos uma cultura clássica
Nos devemos orgulhar
Dela, a Paz!
A Paz pode ser procurada
A Paz pode ser desejada
Mas a Paz tem que ser defendida
Por todos e não só por alguns
A Paz tem que a ser a palavra
Que antecede até o próprio pensamento
E mesmo que a guerra ainda não soa
Mas a Paz existe
A Paz tem que existir!
* Título de um poema de Petarca.
Ao fundo o lago silencioso, adormecido e indolente
De baço luar a refletir nas suas águas
Porque a lua foi de férias para outras paragens
Cintilam nas águas do lago pequenos faróis de luzes
Que parecem dançar levemente
Neste lago de intangível mudez
Que parece estar ali para receber toda a paciência do mundo!
Deslizo emudecido e refletido na noite escura
Iluminado, como se estivesse inspirado,
Mas profundamente concentrado
A escrever o texto que se anuncia
Por pequenas candeias
Como pescadores nos rios interiores da China
Que lhe dão sentido à vida!
E no meio das suas águas prateadas na noite escura
Vislumbro um agitar ténue de figuras
Que vagueiam pela superfície da água…
São patos que, mais uma vez me perseguem,
Mas agora inclementes a nadar, notívagos
E sem a vaidade dos primos que avistei recentemente noutras paragens!
Circundo o lago, sigo a sua fisionomia,
Através de uma estrada que o rodeia
Que o parece perseguir e, ao mesmo tempo, empertigar
como que o relembrando que há limites para a desfaçatez
E no meio da minha divagação noturna
Em que vislumbro, aqui e ali, mulheres solitárias ou na companhia de cães
Pois os homens estão atrofiados a olhar a tela para ver a Seleção jogar
Dou-me conta de que um gato vagueia vagabundo
Pelas margens do lago e pelo caniçal onde se ouvem flautas a tocar lindas composições
Vejo que o gato parece andar entretido à procura de algo
Mas não sei o que busca
Mas os gatos alguma vez dizem ao que vêm e o que querem?
Este gato, em especial, parece divertir-se
Por entre as pequenas canas junto a uma das margens do lago
E dou-me conta, então, que o felino
Tem uma pequena mancha esbranquiçada no peito
E, de súbito, vejo que ele parece divertido lambendo as patas dianteiras
Mas, a certa altura, o gato senta-se sob as patas traseiras
E estica as patas dianteiras, aquelas mesmo que antes havia limpo de forma meticulosa
E naquele posição esplendorosa, sentado e ereto,
A fitar-me com aquele olhar desconfiado que só os gatos sabem fazer
É chegado o momento, digo para mim próprio, de lhe tirar uma fotografia
E quando me preparava para o emoldurar numa magnífica posição fotográfica
Eis que o malvado se escapuliu…
Fiquei desalentado e frustrado por não conseguir captar posição tão magnífica do gato
Que, estou certo, daria uma fotografia de excelência
Até porque os gatos não costumam rondar em zonas tão próximas aos lagos
Mas aquele, por alguma razão em especial, estava ali
Para contrariar os pensamentos únicos e as frases feitas
Com que costumamos brindar o que quer que seja
Porém, ainda bem que o gato não se deixou fotografar e se escapuliu
Pois a ausência de uma foto fez-me escrever sobre este episódio
Que tanto me impressionou
Sobretudo a atitude altiva e esguia da fuga do felino
Evitando deixar-me agarrar, tocar e muito menos fotografar
E lembrei-me daquelas pessoas que se mantêm na sombra
Na penumbra, no anonimato, nas courelas do incógnito
Apesar de ativos socialmente
E foi então que refleti sobre a minha própria figura
Desde o nome, passando pelos vários eus que vou anunciando
E celebrado por um sempre presente pseudónimo
Que me permite
Em cada momento
Dizer o que quero e como quero
E não dizer
O que os outros querem que eu diga!
Glória aos patos
Honra aos gatos
Manifesta celebridade aos humanos
Que, como eu, escrevem para tocar uma certa realidade
Mágica, muitas vezes, que parece levitar por cima das águas do lago
E que se transforma em borboletas sorridentes
Vestidas com as suas vestes coloridas
Que seguem o canto do rouxinol que se anuncia na árvore vizinha.