MEDITAÇÃO SENSORIAL
Rendido ao extrair voluptuoso dos adereços
Que cobrem essa tua intimidade
Preliminares que antecedem o júbilo
Deixo-me enlevar pela tua singular e afirmativa
Maneira de cumprires as tuas obrigações
Resquício dessa recordação do teu efémero pai
Mas quando estás próxima de conseguir
Acabas, sofrida e angustiada,
Por enterrar o êxtase
Que os teus sentimentos tanto te pedem
Silencias-te
Mergulhas, então, em monólogos
Desvirtuada e ressentida
Porque a graça parece ter-se esfumado
Exibes um sorriso fácil
De benevolência
E uma aparente boa disposição
Que não se casam com o teu olhar
Que, distraído e colhendo-te uma mirada desprevenida,
Deixa transparecer uma melancolia inquietante
Que me demanda o afeto que nutro por ti
Mulher cansada de ilusões
A quem dura e sentida tem sido a vida
Até o consórcio afetivo
Que começou por ser de entusiasmo e paixão intensa
Se foi quedando na frieza
De cada um no seu canto
Do leito conjugal
Longe um do outro
E amparados às almofadadas
Aquela mulher que no passado se suplantava
E parecia não se submeter a ninguém
De eminente consideração de si própria
Que extravasa líbido
Olhava sem pudores nos olhos
De sorriso maroto e insinuante
E se antevia nela
Um forte desejo de ir em frente pela aventura
Vive hoje de um certo brilho do passado
Como uma estrela que cintila nesse imenso céu escuro
E quando a olhamos
Questionamo-nos se ela todavia ainda tem vida!
Mas, estrela perdida, não perdeste o desejo
E, mesmo discreta e fundadamente,
Atreves-te a, por vezes,
Sonhar, desejar
Que uma bela história de amor
Te liberte do sótão encarquilhado e poeirento
Em que guardas o livro das tuas memórias
E voltes a edificar esse jardim
No Éden
Onde tantas vezes
Trocaste a formalidade e a aparência
Por um subversivo e ousado beijo
Que logo te deste no instante
Que te deixaste esquentar
E fruíste no desejo
Esse rio que corre dentro de ti
Nesse teu mundo subterrâneo
Que não morreu
E que é a fonte desse empolgamento
Que continua presente
Mas optaste pelo silêncio
E empurraste-te para esse território
Em que esquecimento nidificou
Acabaste por enterra-lo
Para te convenceres que não tens mais idade para certas coisas
Mas sim, tens idade, e tens graça ainda
Para dar e vender e sabes
Tenho a certeza
Fruir dos instantes da vida
A cada instante e ser e fazer júbilo
A quem em ti confiar o destino
Tens ainda a vontade de uma adolescente:
Trepar uma árvore
Deitar-te na relva
Meter uma fina palha na boca
Despir-te
Roçar esse corpo cansado
Aprisionar o desejo que há em ti
Num corpo compacto que te deseje
Como tu o desejas
Fazer amor nos locais mais improváveis
Porque, domesticada, silenciada
Levada a…
Continuas a mesma flor silvestre
Que eu conheci lá atrás
A espiga de milho que merece ser desfolhada
Desfiada, desflorada, desnudada
Porque a mulher mudada
Aparentemente
Pelas circunstâncias da vida
Conserva os sentimentos
Da água cristalina
Que corre apressada e límpida
Da nascente
Mas esse rio que te abastece
E que escassos são os que o conseguem avistar
Subterrâneo, porque assim as circunstâncias o exigem,
Não tem fim
Dentro de ti tens a fé inabalável no progenitor
Que zelará
Na viagem terrena
Por ti
Eternamente
Para te compensar da fugaz convivência!