ARREBATADOS
Nessa Grandeza que anuncias ao mundo
Acabas inspirando-me
Com elegante sumptuosidade
Do imenso caleidoscópio
Que me vais dando a conhecer
Desse teu interior
Cada vez mais arrebatado
Humano
Imensamente emotivo
E sentimental
Paisagem que se exibe a nossos pés
Desde esse mamelão
Onde,
De mão dada,
Recuperamos o cansaço
Da íngreme subida
Que sabíamos nos conduziria
Ao jardim do Éden!
Silenciados pela excelência
Da vista de pássaro
Que nos é dado a contemplar
Desse leito verde que parece universal
Onde ambos nos deitamos
Deliciados
Naquele púlpito
Onde, aos poucos,
Vamos dizendo
Tudo o que sentimos
Um ao outro
As aves esvoaçando
Aparentemente sem sentido
Dão-nos o seu testemunho
As ervas mais ou menos daninhas
Que ouvem as nossas preces
São observadoras deste nosso Amor
Sentados nos penedos
Que ali são trono de realeza
Onde são recebidos estes dois príncipes do Amor
Que só ali se podem comunicar
Como dois amantes clandestinos
Mas,
O suposto diálogo
Afinal não passa de um sonho
Pois não conseguem dizer nada um ao outro
Acordam sobressaltados
E cada um deles já lá não está
E o sol
Desesperado que todos os dias
Ali vai recrudescendo
Nessa tímida luzinha longínqua
Que vai aumentando progressivamente
E acaba iluminando os rostos radiosos dos dois
Que ali montaram
Edificaram
Um monumento
À grandeza da nobre Paixão
Ambas criaturas boas
Nobres e sensíveis
Afastados longinquamente na vida real
Parecem ausentes um do outro
Mas ativamente espirituosos
E estimulados
Ao que um e outro vai produzindo
Mas tão perto
Na combinação das palavras
Para compor a dança das frases
Que se vão emoldurando
Em cada uma das páginas do Livro
Só eles,
Verdadeiramente,
Só mesmo cada um deles
Sabe o que uma simples vírgula atrevida
Pode significar
Mesmo que pareça
Errónea
Corrosiva
Cruel
Aterradora
Pode até, enfim, perecer
Numa escorreita leitura
Mas os dois saberão sempre
O que ali vai
Só os dois
E lembrar-se-ão,
Muitas vezes,
Da neblina
Que repousa nas montanhas circundantes
Do amanhecer que é sempre tão esperançoso
Mas o sol, o sol, cingir-se-á a nascer
Pendurar-se-á no céu
E acabará caindo sob a montanha
Antagónica à que o viu nascer
Mas que fofa vegetação
Onde poderíamos deitar a profundidade dos nossos sentimentos?
Não vês que era mesmo ali que o poderíamos fazer?
Não sentes que é ali que nos podíamos deitar
Naquele remanso eterno
A ouvir, mesmo que seja por breves instantes,
Os lamentos, que tanto gostas, do vento?
Mas essa tua fé
Nesse Deus monolítico
A que recorrentemente oras
Deixa-me circunspeto
E acabo tendo alguma inveja
Pois como gostaria de ter
Tão inabalável e virtuosa Fé
Como a que expões garbosa, assertiva e assaz orgulhosa
Nessas páginas do teu livro!