LONGE DE MIM
Não quero os ditames
Dos que, a troco de falsas modéstias,
E dos que, enfim, dizem nada saber
Se cintilam em garantir que não são escritores, poetas ou declamadores
Nem estão interessados em escrever
Nem muito nem pouco
Nem tão pouco perdem tempo com ninharias ou vacuidades
Exibem uma costela serrana
De bons pastores
Sobreviventes nas altaneiras serranias
De rigorosa e fria exigência
Hábeis no maneio dos ventos mais untuosos
Que sopram, em certos dias,
Nas areias movediças das dunas junto ao mar
Essa gente sempre extraí uma declaração
Um ditame
Uma frase
Um verso
Ou um poema inteiro
Dedicado ao autoelogio
Esse sim tão assumidamente vácuo
Que o melhor mesmo
Era fazer como se faz ao gado transumante
Mudá-lo de uma paisagem para outra
Para que ele pudesse encontrar pasto sempre viçoso
E palco que resplandecesse com tamanha originalidade
Do nosso amofinado poeta, reluzente escritor ou talentoso performer
Que diz “NÂO” a qualquer rótulo
A qualquer qualificação
A qualquer tentativa de lhe comprar a atenção
Mas depois cede ao engulho
À mínima vaidade dos que o elogiam
Logo se entrincheira no gabanço
Na blasfémia coquete, afetada,
Que tanto vê nos outros
E quando nos acercamos ao seu lar
O que vemos?
Dizeres pintados nas paredes do próprio
Que se assume tão original
Que até usa um pseudónimo
Mas acaba logo por sucumbir ao imediato
Assumindo que o que usa é pseudónimo
O que significa que tem um outro nome e vida
E está mortinho por dizer quem é
Mas mantém-se imóvel
Como esse peixe-ogro
Que aguarda pelas presas imóvel no fundo do mar
E quando capta a presa na sua caixa do correio
Afunda-a, isso sim, com vacuidades
Confessa no seu mural,
Que o que gosta mesmo é de escrever, de contar,
E de ver tanta gente que o visita a elogiá-lo
- Que gosto…que talento…que ousadia…que performance tem o nosso autor!
E como exemplo da sua grande cultura
Se põe ali a dissertar sobre política
- Ó como ele sabe de geopolítica…
Como ele é erudito em arquitetura
Até se mune de projetos escritos
E de complexas formulas matemáticas
Como ele conhece os ditames do mar
Como ele sabe como Eólo se expressa
Como ele convence uma plateia de céticos
Como ele consegue reunir uma manada
E sorridente parte
Montando, ora numa, ora noutra,
Vaca
Esse rei que tanto pode ser
Dos pacíficos gaibéus
Como dos extenuados ratinhos
Como dos sofridos pescadores
Que vivem agressivamente instáveis, inseguros e perdidos
No epicentro do rebentamento daquelas vagas
Que, em certos dias se fazem sentir,
Por ação direta do Canhão da Nazaré!
Viverei apartado dele
Sim
Viverei
Longe desse monumento ao endeusamento
À altivez
Às comendas
Que tocam nas cordas da guitarra
No restolho dos dias
Em que, implicitamente,
Passa os dias a falar sobre si próprio
Mas garante
- É sóbrio, é simples, é discreto
E também não se atafulha com grandes imagens
Quando a jactante divindade se expressa no seu mural!
Ah…e como ele gosta de se assumir afastado dos demais
Diz-se até que é uma espécie de anacoreta
Que logo provoca um “ah…”nos demais
Mas se apresenta soez, como um faroleiro de província,
De pseudónimo pendurado ao peito
Mas que espera que o trespassem na sua morada eletrónica!
Shalom amigo(a)
Como se diz no meu linguajar,
Mas longe, bem longe, de mim!
O poema do Camilo Castelo Branco de sua dignidade dada à estampa sob os prolegómenos de “Os amigos” decerto iluminará o meu fadado asceta, a quem recomendo a leitura!