ETERNO E TERNO PASSADO
Do sol raiado e escarlate
Que desliza suave e vagaroso
Até ao seu covil no horizonte
Que deixa escapar os cintilantes braços
Por entre os interstícios
Dos galhos de uma árvore
Que parece ter sido aparada
Pelos nossos desejos
Das nuvens que pasmam em acreditar
Do sol, deste sol de fim de tarde,
Tão ambíguo e tremeluzente
Mas acredita mesmo é em ti
Que buscas o calor da palavra
E de um Amigo
Mesmo que seja nas profundezas
Da tua ávida memória
E eu
Rendido a esse pequeno alto de uma escarpa
Que parece um dos teus seios
A gretar e a ultimar o desejo
De roçar ao de leve na água do encantamento
A voz, a tua voz, que eu ouço dentro de mim,
Por vezes, é sincopada como uma levada de um rio
Que desliza voluptuoso pela encosta baixo
Por vezes, corre graúda pelas margens
Caindo de supetão na clareira de uma pedra
Provocando um turbilhão de sons
Mas, às vezes, escondes-te no silêncio
E procuras vestígios dele
Como se fosses mulher ciumenta
Que busca provar a infidelidade
Mas nesse Altivo
Onde estou eu
Onde estás tu
De lugares passados onde nos conhecemos
Onde a minha beleza tanto te fascina
E onde esse teu desejo
Que só existe na minha cabeça
Me deixa vontade de te beijar
De te envolver infinitamente
Com o meu manto dedilhado de palavras
Por quem eu dobro
Por quem eu quero
Por quem eu desejo
Mas, apanhada por mim,
Apanhado por ti,
Já não conseguiria passar muito tempo
Sem vislumbrar, contigo a meu lado,
As caçadas que fizemos
As preces que evocamos
As exímias palavras
Com que falamos sobre o Amor
Contigo a meu lado
Mesmo perante um ameaçador céu
Carregado de nuvens avassaladoras
Que parecem querer manchar este nosso encontro
Não poderia estar mais de acordo contigo
Altiva, mas soberba imagem,
Que de ti para mim
Não esquece esta minha roda vida
De tão frágil marceneiro
Que com as palavras
Tenta construir bonitas peças de madeira
Que embelezam as estantes vazias
Pela tua ausência
Pela minha ausência
Pela distância física a que nos encontramos
E como vivemos juntos esse outrora,
Caçando nas mesmas matas
Procurando os cogumelos que tanto nos agradavam
Colhendo as uvas bravias e doces que nos matavam a sede
Porque não regressarmos,
Como se ele fosse eterno,
Ao passado?