A CASA
A casa, não era mais do que um refúgio.
Há muito que perdera a noção do conforto, do gosto em permanecer no seu interior, do prazer que eventualmente poderia usufruir por poder nela habitar, a gratidão associada ao edifício que alberga os pertences e as recordações da residência, móveis, mas acima de tudo nos fantasmas que por ali pululam.
Dera-lhe para ideias recortadas e perigosas que, implicitamente, denotavam desgosto, ira, vingança, desde que consumara a expulsão de casa da última companheira, retirando-lhe a chave, proibindo-a de ali voltar a entrar e até em permanecer nas imediações. Era bom, compreensivo, mas quando as situações passavam os limites que ele definia como a fronteira da dignidade tornava-se colérico…
Mas, afinal, a sua cegueira não tinha limites, era proporcional à nobreza dos seus sentimentos que sempre o caraterizaram e que lhe davam a grandeza tão apreciada pelas pessoas que o rodeavam. Começava empolgado, entrava de cabeça quente nos projetos e aportava todo o tipo de sentimentos para que as coisas tivessem sucesso, abria a casa a todos, que recebia com esmerado cuidado, e tinha aquela fragilidade com as mulheres que só os apaixonados têm e que elas, sobretudo certas mulheres de igual recorte ou com tendências mais amplas para o património, adoram!
De manhã, como sempre o fazia e à mesma hora, retirou a sua viatura da garagem para se dirigir para o atelier de arquitetura e enquanto aguardava pelo fecho automático do portão exterior da sua residência percebeu que nele haviam sido pintadas umas letras a vermelho sanguinário, quase assassino; e foi então que juntou letra a letra, palavra a palavra, pintadas à boa maneira de letra de impressa, e compreendeu cognitivamente o que ali estava escrito…
Dizia:
- Nesta casa fode-se bem!