A ESPUMA DAS EMOÇÕES
Por horas
Por dias
Por meses
Deitei-me bem longe de ti
Palha ausente que não me aferroou o corpo
Solitário leito,
Imenso como um oceano,
Onde adormeci
Indagando sobre o futuro
Buscando erigir obstinados pensamentos
Acabou aquecendo a minha solidão
De tanto procurar a cor dos meus olhos
Perdidos nesse deserto pejado de areia
Acabei por me dissipar e ainda mais confuso
Mas a tua ausência
Não me afastou
Nem me fez esquecer de ti
Tornou-me, até, mais cúmplice
Perseguido pelos fantasmas
Estatelei-me no solo
Esventrei-me
Deixei que o musgo verde me penetrasse
E quando te desejava e ansiava pelo teu regresso
Vi que a minha solidão alimentava a minha fantasia
Ouvi-te dizer que a tua valentia
Está na cobardia dos outros
E, na verdade, tu tens essa flor ao peito
Tens a flama que te incendia e te estimula
De viver num vespeiro de cobardes
Que buscam sobreviver e seduzir
Quando, na verdade, a vida dessa gente é deveras vácua
E mesmo que, para além das serranias,
Me tentem convencer que eles é que lá mandam
Mas eu sei que quem lá manda são os de fora
Mas quem mandará, afinal, por aquelas paragens?
Autenticadas pelo subir e descer as serras
Comprovadas na contemplação da imagem
Que se vislumbra no reflexo das águas dos rios
Se não esse poeta, escritor, contista, médico
Com nome de espécie botânica
Que tão bem cantou as almas dessas gentes
Que descreveu emotivamente
Os fueiros descontrolados a desancar sob as cabeças dos homens
A música das concertinas a vibrar nos corpos dos cantadores
Ou que emoldurou os mais belos versos
Numa ode monumental e única
Um momento sublime descritivo
Onde todos se quedam parados, silenciosos e pensativos
A escutar a voz tímida, fluente, envolvente e sábia
E que falta sente a gente desse teu joeiro da palavra
Que te deixava cantar como se fosses um feliz jornaleiro
Nessa jorna fertilizada!
Quem ainda te ouviu naqueles longos discursos
Por alturas do 10 de junho, nessa voz da portugalidade,
Terá sentido um orgasmo de emoções
Na escolha criteriosa da palavra
Que sempre soubestes buscar
Que eu persigo há muitos anos.
E por mais décadas que eu viva
Banhar-me-ei sempre nas tuas águas
Na força torrencial dos sedimentos
Por alturas da monção
Que escorre desde os Himalaias
Que são as palavras
Nesse teu ofício
Com que tu sempre nos presenteaste!