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Artimanhas do Diabo

Artimanhas do Diabo

A OUTRA MÃO

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A mão que, ufana, busca

O crepúsculo das palavras

Enfileiradas

Como se fossem soldadinhos de chumbo

De um desfile militar enegrecido

Assinalado por minúsculas esferas

Que parecem estrelas a brilhar no firmamento

 

Mas as palavras buscam adormecer-me

Embalado pela chuva que cai em frente à tua casa

Aos melros e rolas que disputam os mesmos lugares

Aos lamentos que saem dentro de ti

Nesse primeiro café da manhã

 

Orbito, sem nada fazer,

Sem nada tentar,

Esvoaço por ali adiante

À espera de te ver  

De alcançar esse teu coração

Guardado para mim

Desses dois seres que há séculos

Tão bem se conhecem

Que embalam junto às suas janelas

Há procura um do outro

 

Mas chove

E a mão elegante se encolhe

Pontuada por pequenos cabelos entrincheirados

 Que já foram alourados

E aquele minúsculo sinal 

Que é como a minha marca

O meu diamante que me enfeita a minha mão

E onde estiveres, essa mão seguir-te-á,

Na praceta, nos campos de ervas,

Ou junto às flores que balançam solitárias no meu jardim

Titãs que não se conhecem

Mas que se amam

 

E o vento que sopra suave na manhã

O café que saboreias devagar

E a saudade que grita

Pela mão que embala as letras

E os dedos longos que são

De cada uma das letras

 

E diz-me que regressas

Mas regressas mesmo

Para o leito seguro

Mas não queres tu

Cambiar o seguro pelo inseguro

Não queres tu orbitar

Junto a uma luz que te guie?

 

Essa fé indomável que tens

É a mesma fé que te faz acreditar

No amor das palavras

Nessa crença que, todas as manhãs,

Lá estarei eu

Lá estarás tu

A sorver cada novo canteiro

Que todos os dias

Cada um de nós planta?

 

Por mais manhãs que se desenrolem lá fora

Por mais pássaros que adejem

Por mais corvos que avistes

Nessa, ou noutra manhã,

Desejarás avistar-me nesse céu

Em trânsito

Onde nos conhecemos

 

E eu silenciado

Saro as minhas feridas

Nesse meu orgulho

Que é tanto de heroico

Como de demencial!

 

Afinal, desperta ou a dormir

Tu és a outra mão

Que falta naquele corpo

Que se esconde e que completa

Cada uma das nossas vidas

 

É possível, é possível

Amar as palavras

Desejar as mãos

Que se escondem

Por trás das sílabas?

 

 

 

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