DÁ-ME UM ABRACINHO
Nos olhos
Azuis
Que espelham o fundo da tua alma
Jactantes diamantes
A cintilar
Em radiosos dias solarengos
Brilhando como a estrela única
Que nos guia o norte,
O olhar
Antes vivo e resplandecente
Surge agora como mar fustigado por uma tempestade tropical
O teu corpo
Já não obedece aos ditames do teu bravo querer
Queres, mas já não podes
Pois esses braços fustigados
Nos últimos anos
Por perfurações minúsculas de seringas
Custam enormidades moverem-se
Mesmo que seja para içar um simples copo,
As tuas pernas
Movem-se pesarosas e lentas
À custa da voz que a teu lado
Te vai estimulando
Como sempre o foram para ti na vida
Para te dar o alento necessário
A ultrapassar todas as dificuldades
Porém, já não respondes ao que te pedem
Já não ris
Nem choras
Ao que te comove
Apenas te interpelas
Com um ar de adormecimento
Como se fosses um sonâmbulo,
De súbito,
Ergues a cabeça para indagar num tom suave:
- Eu já morri, não foi?
E quando a teu lado
O desespero se transformou em impotência
Dos teus lábios
Sempre austeros e destituídos de palavras e de sentimentos
Volta a ecoar uma frase
Tão comovente como intrigante:
- Dá-me um abracinho!