FLOR CEIFADA
Alma acolhedora
Benigna sentinela
De coração selvagem
Atropela-se
Mas acaba fluindo
O que no seu interior
Vai fervilhando como lava
E as flores,
Mesmo tão próximas do vulcão,
Vermelhas da cor do fogo
Medram viçosas
Mesmo tão frágeis
Mas flores há
Que no campo
Irradiam felicidade
Mas isso é apenas pura ilusão!
Celebra Amiga
Rejubila
Canta
Até que a voz
Que para tão longe se foi
Regresse,
Como as cinzas à jarra,
Donde se havia esgueirado
Num dia em que a música
Se ausentou, de vez, da tua vida
E te ficou apenas um vago desejo de cantar
Gritos que se enchem de preces vingativas
Saem dos lábios descerrados
Do homem
Que acha que lhe pertences
Como se fosses um objeto
E os gritos tolhem-te a vontade
Deixam-te silenciosa e aterrorizada
Mas esperançosa
Que ele te ame tanto
E não acabe ceifando atrozmente a tua vida;
Eis-me, pois, nesta fresta da muralha medieval
Para aqui anunciar ao mundo
Ondo costumo ouvir o vento
E onde presto toda a minha atenção
Para ouvir este vento
Que se movimenta ciclónico
Em fúria
Brutal
E assassino
Que te lançará nos caminhos da destruição!
Aguardo que as tuas mãos deslizem pelo papel
Desenhando com essa caligrafia arredondada
As luzes e as sombras
Que a obra a quatro mãos exige
Renega ao teu nome
Dispersa as histórias
Que são a história da tua vida
Sê frugal, mas não simples
Abjura à pátria
Mas não renegues ao amor
Não fujas dele covardemente
Não abomines o ridículo
Não exorcizes a maldição
O que disseres
O que fizeres
Rasgará as nuvens
E a estrela iluminará os céus mais enegrecidos
E a água cristalina do oceano
Refletirá o azul vivo do céu sem nuvens
E se planteará, perante, as linhas que,
Como escadas,
Darão a frase e o mote
Donde brotará o poema
E os dedos longos fazem-se às teclas
E os meus pensamentos
Procuram os teus
E os teus
Os meus!
Mas, afinal, homem cruel, porque mataste?
Porque abateste
Aquela a quem dedicaste
Tantas palavras
Tantos versos
Tantas juras?
Podias, ao menos,
Ter-lhe dado morte mais corporal
Uma faca, por exemplo?
Mas escolheste coisa tão vil
Uma bala que lhe trespassou o coração…
Mas alguns ainda dirão:
Ele era muito amigo dela
Amava-a tanto
Que acabou por não resistir…
Mas está arrependido?
Ó se está
Ó se está...
Um pobre diabo
Coitado!
NOTA: Na impossibilidade de identificar uma a uma, como se fosse um extensíssimo mural, cada uma das mulheres que foram assassinadas por motivos fúteis pelos maridos em Portugal e no mundo, dedico, a todas elas, este sengelo mas sentido poema.