FUTURO TÃO DESEJADO
ORAÇÃO LITÂNICA
A manhã já nasceu.
Assobé afasta de nós todas as dores,
Todos os males,
Todas as desgraças.
Assobé, faz com que cheguemos a casa, felizes.
PIGMEUS - ÁFRICA EQUATORIAL
Néscio campo de ervas
Que crescem espontâneas
Cães maduros que farejam o odor da carne
Borboletas peregrinas
Que esvoaçam ao encontro dos néctares
Que elas intuem como os mais saborosos
Que se escondem nas flores mais coloridas
Homens que aguardam pelo favónio
Que lhes dará a indelével raça
Dos deuses
Uma ficção que não esmorece nem se atormenta
E mostra-se tão real como a saudade
A paz imperial tarda em voltar
Nem os cavalos regressam
Ao reino de Ricardo III
Nem as três mulheres
Do sabonete de Araxá
Me hipnotizam já
O reino despido
Árvores nuas e feridas
Ramos que roçam uns nos outros
Não sei se mais alguma vez verei luz
Do azul que abria os meus horizontes
Do verde que me animava
Do laranja do sol ao deitar
Agora vejo tudo negro avermelhado
Já nem os azuis sardões
Poderei admirá-los
Quando o sol vier
Apenas as víboras
Aguardam por esse verão que, todavia, não chega
E as águias imperiais
Lá do alto
Que guardam os céus
Atraem os olhares
Das gentes que ali vão para as ver
Das apavoradas aves
Que não sabem o que dizer
Porque já nem os homens as protegem
Mas algo me diz
Que não poderás atormentar-te eternamente
E virá o dia
Em que voltarás a ouvir os melros
Com as suas flautas mágicas
Escutarás os rouxinóis
Em incansáveis melodias
A chamar por ti
Como os sinos chamam as almas
E os rios pululados
Por aqueles odores
Adocicados, anisados
Entrarão numa luzidia manhã
Carregados de bogas e de trutas
E encher-te-ão
A mesa de iguarias
E o vinho tinto a escorrer pelas gargantas
O desejo, outra vez, que o verão não acabe jamais
E não vejo a hora que esse tempo chegue
Ouve-me
Ouve-me apenas
Por enquanto...