GUARDEM-ME ESSAS FRONTEIRAS, MAS COM CUIDADO!
Ponho-me a esmiuçar
Os espasmos
Que, em certos dias,
Me chegam desde a minha memória
Acabam por me convocar e interpelar
Mas sem uma razão aparente
Fantasias
Quimeras
Ou mesmo resquícios de sonhos
Mas também
A realidade vivida
E lá atrás
Bem na confluência
Do términus da escola primária
Olho para a preocupação paterna
Dar a conhecer os monumentos históricos
Estudar-lhes os finos traços
As reentrâncias trabalhadas
À mão do maçon
E a simbologia que,
A cada um,
Lhe estava implícita
Isto há cinquenta atrás!
E, de repente,
Abre-se-me a mente
Agigantam-se os meus olhos
Vejo-a aqui ao lado
A grandiosa Espanha
Tão perto e tão diferente
Repleta de História
E de monumentos com história
E nesse passado
Acabo rendido à nostalgia dos caramelos vaquinha
Ao doce sabor dos chocolates
Que em Portugal atingiam preços proibitivos
O bacalao…
Em Espanha muito discretamente no prato
E em Portugal indispensável
As calças de ganga
Consideradas subversivas cá no burgo civilizacional!
E ali, na raia,
Tudo era tão generosamente fácil de adquirir
Pela fartura e preços acessíveis
Mas de repente,
Enquanto me vanglorio
Com essas pequenas histórias
Vem-me à memória
Essa gentalha que vivia na fronteira
Piores, muito piores que os contrabandistas,
Esses funcionários a quem lhe era dada casa, mesa e roupa lavada!
E permissão para,
Naquela chusma de fardas acinzentadas
Que tanto ódio provocavam nos portugas
Que entravam em Portugal,
Poderem ser tão prepotentes
Tão autoritários
Que presenteavam com um Chega para lá
A quem ousasse protestar
Ou sequer dizer algo
Esses odiados homens
Arrancavam de supetão as gangas das mãos dos adolescentes
Limpavam as malas dos carros
Lançavam as compras dos pobres visitantes a Espanha
Para uma sala apinhada de haveres
Que depois era distribuída pela comandita
Que viviam como javardos
Que comandavam como generais arrogantes
Instituídos de um poder ilimitado!
Como é que num país com umas fronteiras com este passado
Se podia achar que era fácil instituir uma polícia das fronteiras
Com um historial tão peçonhento e tão tenebroso?
Não se imaginaria que uma instituição assim
Com este lastro tão negativo
com alguns atuais elementos descendentes dos velhos guardas
Outros que passaram da velha guarda-fiscal
Para o novo serviço, entretanto, criado
Soubesse estar à altura?
Não são as formaturas académicas
Que formam as consciências cívicas
É o berço, é a procura da realização da cidadania plena
Em suma, os direitos humanos que devem ser sempre observados
E realçados em qualquer situação
Seja em quem acabou de perpretar um crime horroroso
Seja num ladrão do tipo de um pilhas galinhas
Seja num indocumentado
Num ilegal
Ou em quem vem procurar uma oportunidade no nosso país
Numa terra onde tantos dos seus nacionais
Se arrojaram na procura de novos mundos
Uns que ganharam a aposta
E outros assim-assim!
É claro, é evidente
Que este novo serviço,
Quando foi criado,
Iria dar raia!