MAR
Move-se a água
De uma forma solene
Medonhamente suave
Quando olhamos para a linha do horizonte
Como se estivesse a absorver
De uma só vez
Todos os nossos pensamentos
Incessante, o vento,
Ali se confunde com o mar,
Vai-me interpelando permanentemente
Estrondoso e afogueado
Quase parecendo um jargão
Que se expressa num sopro impercetível;
Não se comovam com as palavras
Não se gastem com as ilusões
Não temam as consequências
Não se fiem nas aparências
Não se amofinem nos dias
Em tudo semelhantes
E que parecem banais…
Deixem que a espuma
Converta a maresia numa bênção
E, naqueles pequenos charcos marinhos,
Vejo-te à mar
Assustado
Apressado
E a bater em retirada da costa
Sem cuidar dos seus
Nesse microcosmo marinho
Rodeado de pequenas lagoas
Cercadas de pequenas rochas
Que parecem desfiladeiros
Onde se avistam pequenos peixes
Certos moluscos
Cerceados da liberdade
Mas que,
Como a maioria dos homens,
Têm pavor das profundezas do mar;
Mas o mar, esse mar
Que tanto nos atraí
Quando se veste com o seu lindo fato azul
Assusta-nos quando se farpela de cores mais acinzentadas
E que não esmorece assim tanto
Quando o sabemos rodear
Quando gostamos verdadeiramente dele
Quando conhecemos todos os seus segredos
É, afinal, o mar que só conhece a ilusão
De um mosaico colorido
Que os nossos olhos
Tanto perscrutam;
E o mar deixou-se levar pelo pescador
Deu-lhe o descanso que ele tanto merecia
Mas não me deixem permanecer só e junto só mar
Temo que voltarei para ele
Para nadar livremente até às profundezas
Para me esconder das vergonhas que passei
De alguns homens;
O mar é esse caldo temperado
Que sustenta e sustenta-se dos seres que nele vivem
O mar não quer voltar à terra
Quer permanecer lá onde está
Encostado à linha do horizonte