MAR DE QUIETUDE
Vontade não é bondade
É querer servir
Permanecer sempre no mais alto
Não temer a fúria dos mares
Enrolar-se nas suas ondas
Mesmos as mais ferozes
Experimentar o sabor salino da areia
Levar com a força do vento
Que sopra interminável
A colidir contra o dorso
Viajar até longe
Voar
Voar
Como uma leve pena
Até que a noite caia
Como sempre
Ameaçadora
E regresse a ave perdida
Que há em todos nós
A tentar fugir daquela escuridão;
Se há vaidade na escolha
Há desespero no impasse
E cada dia
É uma eternidade
Cada instante
Uma espera interminável
Uma secura medonha
Que, avassaladora, persegue
A ilusão de uma vida feliz
A vontade de terminar
A construção da casa
Onde mora o coração
Que aquece a paixão
Onde reside o pulmão
Que acalenta a esperança
De uma suave caminhada
Por fim, acreditar
Que a espera interminável
Que parecia consumir todas as energias
Cesse
Nessa viagem
E voltem a surgir
Aqueles petizes olhos sorridentes
Que, certo dia, zarparam na barcaça
Com as velas insufladas
Ao vento
E mareou nesse mar da quietude
Que acabou deixando-os loucos de podridão
Corroídos por dentro
Mortos por fora
Sem que sobejasse já
Um qualquer sentimento
E passou, pois, a vida a ser guiada pela indiferença
Adiar…adiar…
Até que a embarcação
Parasse de vez numa enseada
Onde felizes homens e mulheres
Derramaram as suas vestes
Expeliram o rancor e a revolta
E passaram a viver cada momento
Único das suas vidas
Esquecendo as juras ao circunstancialismo
Queimando as suas indumentárias
E desnudos
Não enjeitaram a felicidade
Que tanto porfiam
Até que finalmente a alcançam!
Mas quem deseja o mar sereno
Sem ventos e ondas
Aventure-se solitário
Nessa quietude irritante
Que exaspera quem tanto espera da vida!