MURMÚRIO
Voz embebida em palavras acetinadas
Suaves, esbeltas, resplandecentes
Solidão
Que é intermitente
Como uma luz que cintila e se apaga
Farol que se vislumbra
Na imensa noite oceânica
Revigora a minha alma enrugada
Robustece ainda mais a firme convicção
Acaba envolvendo o meu cândido coração
Basta-me
Aquece o meu longilíneo corpo
Seduz os meus olhos
De íris esmeralda
Que, sorridentes,
Me fazem sentir a criança que trago dentro de mim
Acabo emocionado
E enregelo a minha razão
Delicadeza
Elegância
Amor
Afeição
Que emanam das tuas palavras
Dos teus gestos calorosos com que me recebes sempres
Deslizar sereno desses teus longos dedos
Com que percorres com minúcia
Nesse exame do meu corpo
Em que registas tudo o que de novo ele contém
E antes nunca visto
Mas os teus dedos tornam-se ainda maiores
Extensas unhas de gel sobressaem
Excitas a minha pele
Descerras os meus poros
Cobres-me de carícias
Deleitas-me
Nesse amor tão intenso
Tão presente e obsessivo
Que no silêncio se enche de súplicas
De desejos
De volúpias
Nesse teu altivo e esbelto coqueiro
Onde adoro me esfregar
Olvidando avinagrados instantes sem te ver
Resplandecente jogo de sedução
De árvore espaduada, elegante e tão briosa
Acabo irrompendo
Pelo infindável tronco
Como se fosses uma girafa
E eu uma dessas aves que te alivia
Desses animalzitos de menor dimensão
Que tanto te incomodam
Que trazes contigo
Desde que nasceste nessa distante província de Cabo Delgado
Confinante com o mar
Com nome tão elegante e feminino como Porto Amélia
Árvore que se dobra
Nesse vento constante que grassa na costa de Moçambique
Despojas-te
Ofereces-me a tua bela casca
O teu peito arquejante com que me recebes sempre
E quando
E quando
Por fim me delicio num inesgotável abraço
Sobressai um beijo imenso e quente
Que me resplandece a paixão
quando te olho de tão perto
E acabo olvidando
A malignidade que há no mundo!
E o vento ofegante
E a luz intensa
E o cheiro a terra
E esse mar agitado de cor azul
Ora azul-turquesa
Ora verde-esmeralda
Ora azul escurecido
Azul apenas
Não me saí do esquecimento
E lamento os dias em que viverei
Sem o poder vislumbrar!