NASCI EN EL MEDITERRÂNEO*
Melodiosa música
Esta que vos apresento
Que trespassa
Com a sua envolvência
As paredes do corpo
E que acaba envolvendo o coração
Suave bater do pêndulo
Cuco que esvoaça
De árvore em árvore…
De repente,
O relógio de parede
Dá o mote e anuncia a hora
O som que ecoa
Vem da longínqua Floresta Negra
Voz cristalina
Que se ergue em crescendo
Do soberbo Joan Manuel Serrat
E deixa-me naquele limbo
Do vai e vem
Do sobe e desce
Do mar
Que testemunhou
As maiores epopeias
E as maiores
Catástrofes
Da civilização ocidental;
Camões ignorou-o olimpicamente!
E a música lá se vai estendendo
Até que chega o momento
Em que as palavras
Parecem querer dizer tudo:
- Nasci en el Mediterrâneo…
Vontade de assumir o difícil
Compacta maneira de decidir
Vertical firmeza
Assunção da escolha
Momentos imprescindíveis
É a hora de perceber
Se navegaremos destemidos
Em mar tão azul como este
Não receies
Marinheiro
O mar
Que se abre na frente dos teus olhos
Mesmo que o seu desígnio último seja
Mais que um mar
Um cemitério
Uma fronteira
Um desafio
Mas navega em frente
A glória vencerá
Todas as réstias de indefinições
Que uma existência
Marcada pela calmaria das suas águas
Te possa, mesmo assim, atormentar
Ter a sereia nos braços
Adornando-a de carícias
Preenchendo-a de Beijos
Entrelaçado nos desejos dela
Ânsia em possuir todo o seu corpo
Sorvendo os seus seios maliciosos
Cobertos de mel
Mesclados de sabores de vinhos florais
E a oliveira que testemunha
A ancestralidade
Das águas do mar
As mãos suadas e trémulas
Voz dissonante
Que não o impedem
De ouvir o som do mar
Que soa delicado
Numa sinfonia multicolor
E que parece assumir-se
Como um déspota no meio
Dos suaves gestos
E protagonismos discretos
Em que todos parecem querer viver
As aves voam próximas das embarcações
Parecem querer avisar
Que aquele mar, por vezes, prega partidas
E volto a ouvir:
- Nasci en el Mediterrâneo
Sob a areia do escaldante do deserto
A multidão se apinha
E, sem alternativa,
Quer partir naquelas jangadas
Ou embarcações abarrotadas
Arrebatadamente sós
Ou empolgados na comunhão com os outros
- Allahu Akbar
Porém, a solidão que parece emergir em ti
Foi sempre a força motriz
Que te acabou salvando
Mas, hoje, uma certa catástrofe
Cada vez mais se anuncia
Com os nacionalismos viris
E que parecem querer aniquilar a nossa civilização
Afinal, o que vejo no mar,
Neste mar que é o espelho da nossa civilização?
Silhueta que adorna as tuas águas
Como se fosse um livro carregado de imagens
Perfil grego que emerge
Dónis incestuoso
Que busca nas palavras
Da poesia e da prosa
A sua salvação
E a minha alma
Que parece caminhar num túnel comprido e escuro
De paredes revestidas de citações de filosofia grega
Colunas cobertas por páginas da Torat Judaica
Chão que se adorna de páginas e páginas da Bíblia
Daquelas citações que nos ensinam a pensar
E a não acomodar-se
Aos desígnios de uma vida
Pontuada pelo pensamento único,
De los fascistas...
Pero, “non passaran!”**
* Título de uma música, que é um hino, de Joan Manuel Sarret!
* *Frase de Dolores Ibárruri, La Pasionaria.