O CARDO
RUMO A BIZÂNCIO
Este país não é para velhos. Jovens
Abraçados, pássaros que nas árvores cantam
– Essas gerações moribundas –
Cascatas de salmões, mares de cavalas,
Peixe, carne, ave, celebrando ao longo do Verão
Tudo quanto se engendra, nasce e morre.
Prisioneiros de tão sensual música todos abandonam
Os monumentos de intemporal saber…
W.B. Yeats
O que te posso dizer?
Se já não fazes parte da minha vida…
Podes querer, fazer, executar, empreender
Entrar, sub-reptícia,
Para indagar o que eu faço
Penetrar no que eu penso
Tentar confundir-me
E reentrar na minha vida
Mas não vês que eu mudei?
Mudei tanto que para mim
Tu és agora uma impetrante
Que desafia
E desfia
O passado
E eu, como sempre,
A pensar no futuro!
Não basta dizeres, exclamares
Ou norteares-te
Por palavras fortes
Um tom dramático
Acentuado e pujante de sentimentos
Com aquele ardor
Dos aficionados da Festa Brava
Ou como um romance que respira
Pelos seus múltiplos poros
Para destilar a dimensão trágica
Da narrativa
Esse teu manto imperial que envergas
Ajustado às tuas formas corporais
Donde sobressai esse teu erotismo flamejante
Que se assemelha ao roupão
Que os poetas envergavam no século XIX
Parece-me uma catedral gótica:
Que nos exalta
Quando a contemplamos por fora
Que nos entorpece os sentidos
Quando a vemos por dentro
E remete-nos ao silêncio
À contemporização
A sorver todas aquelas linhas
E acaba por nos demandar:
Absolvendo todos os pecados da humanidade
Quando vemos essa tua inimputável loucura!
Os teus excessos
As tuas venturas
Esse teu sentir na intimidade
A tua audácia
A tua pertinácia
De quem
Tudo quer
E não,
O pouco fracionado,
Esse teu sentir
Único e tão avassalador
É como o desespero do náufrago
É como o vigor da palmeira
Que cresce até no meio das areias longínquas
E foi essa força
Tão animalesca
Que me acabou afastando em definitivo de ti
De repente, e sem que nada o fizesse prever,
Mas tu, sempre foste tão imprevisível,
Quer no amor, quer no ódio,
Encetaste uma tímida tentativa
Como se fosse mero gesto involuntário
E então, suave e subtil,
Almejas reincidir
Entrar na minha vida
Com aquele teu jeito titubeante
Mas só na aparência
Porque em ti nada é oscilante
Quero apenas de ti
Conservar as memórias
Que me bastam para me afastar de ti
Cardo
Como sempre assumiste ser
Capaz de resistir em qualquer latitude
Na terra mais pobre
No clima mas impetuoso
No meio de uma fresta nas rochas
Cardo
Mesmo na solidão
Mostra-se exuberante
Nos seus tons lilás, brancos, azulados ou amarelados
Mesmo rodeado de espinhos
Mas há sempre uma abelha
Que contempla o Cardo
E que sorve, amena e voluptuosa,
Os seus néctares
E naquele instante
Uma abelha acaba pousando no Cardo
Deleitada naquele seu leito real
Protegida pela sua guarda pretoriana:
Os espinhos…
Que são o que de ti guardo
Como a memória mais viva!