O TIGRE
Imploro
Agito-me
Perante a imensidão
Do deserto
Onde cada grão de areia
É um desejo!
Visto-me
Com a escassa roupa
Que, punindo-me,
Me deixaste
E eu
Perorando
Na correnteza
Tórrida e demencial
Dos dias
Suplicando
Para que a noite não venha
Para não morrer de frio
Na solidão deste deserto que escolhi viver.
Mas dias e dias
Noites sobre noites
Na companhia de um tigre
Acabo habituando-me
A caçar furtivamente
A não ter compaixão de ninguém
Nem mesmo de mim mesmo
Fustigado
Pela indomável mesquinhez
Abalado
Pela gratuita cobiça
De quem acha que os sentimentos
Podem ser compensados
Com coisas e objetos
Para mais tarde
Sobejar
Uma aviltante saudade
Tão demencial
Como despropositada!
Mas todos os dias
Na companhia do experiente tigre
Deixo-me envolver
Pelas suas histórias
Acompanhadas de dissertações
Sob façanhas
De um velho marajá
Que tinha mais de uma vintena de mulheres
Perto de uma centena de descentes
E que
Dizia-se
Não conhecia
A imensidão das suas terras
E quando estava para morrer
Meteu-se solitário
Pelas suas terras adentro
E nunca mais foi avistado
Diz-se
Ainda hoje
Que acabou transformado em tigre!