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Artimanhas do Diabo

Artimanhas do Diabo

OS LÁBIOS

Lábios carnudos

Que se encrespam  

Como cristas de galo

Aprumados

Sedosos

E húmidos

 

Eles são a porta da gruta

Onde à entrada erguem-se filamentos de lã   

Humedecidos e ondulados

Sem o vigor dos irmãos que medram no couro cabeludo

Mas entusiasmados como um velho camponês

Que todos os anos espera pela melhor cultura

E vai dizendo:

- Este ano é que vai ser… 

 

E naquele beijo

O último que me deste

Querias que nele coubesse toda uma vida

Sorves-te naquele instante

E eu a ti

De uma só vez!

 

Olhos verdes clareados 

Cútis cor de mármore

Corpo escultural sem adiposidades

De girafa espampanante

Que desde que o mirei  

Desejei-o   

Como se quisesse concentrar toda a força de uma vida

Como as palavras escritas

Que, de ti, soaram para mim

E tão olímpicas se revelaram

Que acabaram por intercetar

Os meus sentimentos mais profundos

 

De ti

Mulher alva de fulgor e entusiasmo  

Senti o verdadeiro cheiro da maresia

 Envolta em colares guarnecidos com conchas e algas

Vi a sereia que abandonou o mar

Em busca de uma paixão para a vida

Os búzios que contemplei nas tuas mãos

Ensinaram-me a respeitar ainda mais as crenças

Filamentos de redes à tua volta

  Ensinaram-me a não me deixar enganar facilmente

 

Em tudo o que te desejei

Que te vi

Vi-me

E acabei por me ir

Abnegado e cúmplice

Como entrei

 

Olhando esse mar azul perfumado

Desde aquela varanda que guardo na memória

E tu sempre tão generosa comigo

Deste-me tudo o que eu te pedi

 Mas já não me podes dar mais

Nem eu a ti

Porque não sei mais onde estás?

 

E vieste agora

Como uma memória enroupada num sonho

Desde o meu passado para me desinquietares  

Como uma órbitra

Lançando sobre mim suaves seduções

Acabando por me exclamar:  

- Acabou…esquece...

Atira-te às palavras com fúria

A tua paixão para a vida!

 

Mas eis que me cruzo com uma outra mulher  

De tez escurecida

Olhos inquietos que olham para o além

Que procuram em cada estrela

Sorver cada instante como se fosse

O derradeiro momento da sua vida

 

Nas suas palavras descortino 

A discreta onça com as suas pegadas

Sulcadas no areal dos rios

Mulher apaixonada, discreta e tão melindrosa… 

Mas não consigo passar sem os seus nobres humores

Sentimentos que brotam de cada um dos seus poros

Dedos ágeis que manejam as letras e formam palavras

 

Pela sua boca

Saem gotículas do desejo e do entusiasmo pela vida  

E que regozija

Quando transponho a sua gruta

Tão primitiva como escondida

Onde guarda todos os pergaminhos

Preenchidos com sublimes odes

Que se inspiram nas paixões da sua vida

 

Mas é com artimanhas que delimita

Através de doces palavras

A sebe que segurará

A quem, afinal, elas se destinam

 

Irmã

De idioma  

De palavras

Não me deixes neste mundo

Sem o vigor dessas tuas palavras

Tão classicamente arrebatadas

 

Posso acabar os meus dias só

Como sós estaremos

Na hora da despedida  

Mas nadando nesse mar da fertilidade

Onde flutuam as tuas palavras

Aí não precisarei mais dos zimbros

Que ondeiam o mar de Sesimbra

Porque ao encontrar-te  

Encontrei-me

E não mais fugirás do meu radar!

Exibe-me, então, esse teus lábios de uma vez

Para eu ver como quentes eles são

E deixa-me regar essa tua planta

Que guardas com tanto viço

 

Deixa-me ver o sangue espesso

Dessa mistura de sentimentos  

Que brota das tuas veias

 A base da tua edificação

Onde mora essa paixão extrema e intocável  

E que é a tua gloriosa salvação!

 

 

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