Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Artimanhas do Diabo

Artimanhas do Diabo

Nesse teu melancólico olhar

Rente, interior, insatisfeito

Fugidio e fugaz   

Alcanço

Num ocasional instante

Em que te revejo

E converso

Essas tuas inquietações

Que me surgem desde ti  

 

Adquiro a certeza que a paixão

Essa que se escondeu

No teu opressivo pudor

E vive agora instalada na sombra

Do teu glorioso passado

Foi substância irrevogável

Que te abandonou

 

Nesse dia em que te revi

Leves gotículas de chuva

Soavam silenciosas no solo

Sem aquela sonoridade

Forte e expressiva

Que nos faz recuar

Perante a sua aparição

 

O dia, apesar de cinzento e enevoado,

Apresentava-se ameno

Mas este nosso reencontro

Não podia ocorrer de outra maneira

Que não fosse

Soar a estranho e, especialmente, emotivo  

 

A conversa discorreu em tom intimista  

A emoção subiu célere e quase de imediato  

E, estranhamente, senti frio

Leves vibrações abalaram o meu corpo

Senti-te tensa e vi breves esgueirares

De olhares para que eu não visse

O que os teus olhos não queriam que eu visse

 

Estremeci e tu, ainda mais, estremeceste

 

Vislumbrar esses teus olhos tristonhos

Desinspirados e perdidos nas tuas memórias

E que se acendiam de júbilo

Quando falavas do futuro

Ou dessa descoberta interior

Filosófica e espiritual

Que tu

Desiludida, arrefecida, despida e desinspirada

Pela ausência de desejo

Que paulatinamente

E sem que te desses conta

Te foi abandonando

Te obrigou a enveredar

 

E foi, assim, essa luz transcendental

De busca, de procura

Pelo crescimento interior

Repelindo o que quotidianamente te rodeava:

Essas pessoas próximas que já não te dizem nada

Que se transformou na única luz que te orienta

Sustentada nessa parábola budista

Que vê um cavaleiro a trotar ligeiro;

Alguém pergunta:

- Para onde vais cavaleiro?

E o cavaleiro responde:

- Não sei…pergunta ao cavalo!

 

Mas nessas tuas mãos enrugadas

De dedos habituados

A esticarem-se

A entrelaçaram-se

A se encerrarem

Na concha da mão

Para não testemunharem  

O magma de sentimentos

Que submergem  

Nesse teu coração destroçado

Sem mel já para o alimentar

E sem a doçura sanguínea

Que acaba repelindo as borboletas

Dessa flor que levas ao peito

Murcha e, estranhamente, muda

E sem néctar

 

Mas os teus olhos

São todo um poema

Uma triste ode aos condenados

Aos que não têm redenção

Aos que mataram e vilipendiaram

Mas tu

Não mataste

Não roubaste

Não burlaste   

Tu apenas querias dar a tua suavidade

Essa tua cor de fogo

Que explode de desejo

Na hora em que a chuva caí

Em bátegas múltiplas

Que acabam arrefecendo

Essa tua felicidade

A que, todavia, não olvidaste

E que anseias ainda voltar a ter!

 

Gostava de te abraçar

De te lançar os meus longos braços

Para te envolver a tua cútis  

Gostava de te relançar o desejo

Mas isso seria trair

Cada um dos nossos projetos de vida

Por um fugaz e quente reencontro

E no final estaríamos os dois

Irremediavelmente sós!  

 

 

3 comentários

Comentar post

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2025
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2024
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2023
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2022
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2021
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2020
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2019
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2018
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2017
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2016
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub