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O amor que te tenho
Não me demove
Não me esmorece…
Pois,
Ele dá-me força e convicção
Concede-me razão de viver!
Embora a minha voz derrape
Nas inclementes emoções
Intimamente confesso-me:
Tu és a luz insubstituível
Que rasga os céus
Iluminando a noite
Inspirando a suprema paixão
Tão presente numa alma
Que tanto quer afirmar
Mas é incapaz de o dizer!
E quando deixei de te ter
Que fiz eu da minha vida?
A minha vida tornou-se um agreste deserto;
Escorres das tuas mãos
O lento suor esgotado
Iças as extremidades das secas searas
Que se anunciam em cada verão
Revolves as folhas esquálidas nos dias cinzentos de outono
Reacendes os caminhos talhados na rocha
Por onde a água que caí das nuvens
No seu passo acelerado
Se entrega a dar alento,
Enquanto escalo a árvore da vida
Roço, ao de leve, na extensa folhagem
Que todos os anos enrubesce
Os doces troncos que alimentam a vida.
Deslizo, em silêncio, pelo gelo
Distendido ao longo da montanha
Abro as minhas mãos
Até ti
Ressoa em mim o teu nome
Grito-o bem alto
E é então que
Esquivo
Começo a lamber as minhas feridas
Sustendo a culpa
Revigorando a complacência
Aceitando o que a vida me dá em cada momento:
Mas sinto tanto a tua ausência!
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Voltarei a ver-te
Ó luz dispersa
Augusta
Que dentro de mim trago desde que nasci?
Pelos telhados do casario
Que vou levedando
Em pequenas oscilações
Levitando,
Envolvo os meus olhos
Numa suave e compreensiva mirada
E deixo-me embevecer
Pelas ruas delicadas e estreitas
Cheias de vida
Carregadas de uma azáfama
De um vai e vem constante,
Acabo nostálgico de um passado
Que já não volta!
De repente,
Como que acordando de um sonho,
De uma das colinas onde todos
Parecem querer seguir
Cada um dos seus desígnios
Dou por mim a rever-me nesse passado longínquo
Que parece fugir das minhas mãos
Como a areia por entre os dedos
Nesse exato local onde
As sílabas com que todos nos ufanamos em declamar
Nos surgem dispensáveis
E parecem já não nos atrapalhar tanto
Pois as memórias que vivem dentro de nós
Surgem como flash
Carregados de luz instantânea
E é nesse momento
Que buscamos uma outra linguagem
Que não se expressa em palavras
Mas que saí sensitiva em imagens
Para estreitar as têmporas;
Até que,
Alargo o meu olhar
E alcanço as divindades
Circundo a minha atenção
E com o credo na boca
Enxugo toda a tristeza do universo
E sinto-me um gato
A expurgar os males do mundo!
![Os-campos-de-margaridas-atraem-a-atenção-de-todo]()
A luz que me surpreende
Ao eclodir de um novo dia
Com a esperança a derrubar
O meu inquieto pessimismo
Não é a mesma
Que a que de tarde me enleva o olhar
A contemplar o horizonte que se ergue à minha frente
Pisando esse chão duro da escarpa onde me sento
A alvitrar o futuro
Que me reserva uma tarde a refletir
E não é a mesma que,
Titubeante,
Se despede do crepúsculo
Com a promessa de regressar no dia seguinte.
Uma nuvem se aproxima
Vagarosa e tímida
E acaba por se interpor
Entre mim e o sol
Num aceno saúdo-a
E ela
Sem que eu me atreva a dizer o que quer que seja
Acaba por me responder
Naquela voz maviosa
Como se estivesse grávida de um desejo
Como só as divindades sabem articular
Naquela doçura omnisciente
Que agarra
Absoluta e definitivamente
A nossa alma.
Um clarão escuro
Desloca-se a uma velocidade estonteante
Compacto e ruidoso
E eis que
Já perto distingo
Milhões de minúsculos insetos
Que voam inflamados e de pose bélica
No seu interior
A nuvem acaba por penetrar no âmago da minha razão
Sobrepondo-se aos afetos
Que me impregnam um entusiasmo recente
E é com aquele ruído de fundo
e disposto a seguir em frente
Que olhando de soslaio
Para uma borboleta que voa num círculo definido
E com suave magnitude
Que acaba por me extasiar
E é então que me pergunto:
- Porque é que, em vez dos gafanhotos, não me visita uma nuvem de borboletas?
Afago as flores brancas
Bravias
Que crescem livres no campo aberto
Mergulho naquele mar odorífico
E deixo-me envolver pelo suave ronronar
De três lindos gatinhos
Que se refugiam de um sol inclemente de verão
Descansando o seu ágil corpo
Na tranquila quietude de um leito de margaridas
Que compactas e bem juntinhas
Fazem uma só
E é neste quatro idílico
Que acabo comovendo a minha justeza
Do olhar mais sério
Que não se deixa penetrar
Pelas razões das conveniências
E que só conhece a linguagem
Pura do Amor;
E uma lufada de vento
que sopra pausado
Esguio e incandescente
Passa por cima da minha cabeça
E lá no alto leio o Mantra:
- Bem-me-quer…malmequer!