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Que o tempo mortiço se avizinha
Mas que, todavia, não se anuncia,
Que irromperá cinzento e bafiento
Carregado de chuvas e ventos
Que acabarão limpando a alma
Anunciando a despedida do verão…
Olho, então, para trás
Para alcançar o incandescente mês de agosto
Pai desse outono que vai chegar
Filho do verão que passou
Transpondo
Sem retorno
E sem saudade!
As folhas, ainda esverdeadas, das colossais árvores
Acabarão caindo ao solo
Jazendo flácidas e enrugadas
Erguendo o leito onde se deitará a esperança;
As águas que jorrarão do céu
Varrerão os excessos
Pejados de sentimentos.
Mas as folhas mover-se-ão ao de leve no chão
Numa dança ondulante
Que acabará por encantar até as mais singelas ervas
Abrigadas pelos troncos dos plátanos gigantes
Que infundem respeito e dão glória.
Nesse campo da feira inolvidável!
Planta solitária
Que traja de amarelo
Que exibe sorriso rasgado
Que se mostra bucólica
Infatigável
Irrequieta
E lasciva
Margarida…
De súbito,
Lança-me uma frase
Acorda-me
Da letargia final de um verão tão atípico
Acabo por compreendê-la
E digo de mim para mim
Aquilo que ela me confidenciou:
- Gostei da terra arável que há em si!
Outono de 2019.
![Os-campos-de-margaridas-atraem-a-atenção-de-todo]()
A luz que me surpreende
Ao eclodir de um novo dia
Com a esperança a derrubar
O meu inquieto pessimismo
Não é a mesma
Que a que de tarde me enleva o olhar
A contemplar o horizonte que se ergue à minha frente
Pisando esse chão duro da escarpa onde me sento
A alvitrar o futuro
Que me reserva uma tarde a refletir
E não é a mesma que,
Titubeante,
Se despede do crepúsculo
Com a promessa de regressar no dia seguinte.
Uma nuvem se aproxima
Vagarosa e tímida
E acaba por se interpor
Entre mim e o sol
Num aceno saúdo-a
E ela
Sem que eu me atreva a dizer o que quer que seja
Acaba por me responder
Naquela voz maviosa
Como se estivesse grávida de um desejo
Como só as divindades sabem articular
Naquela doçura omnisciente
Que agarra
Absoluta e definitivamente
A nossa alma.
Um clarão escuro
Desloca-se a uma velocidade estonteante
Compacto e ruidoso
E eis que
Já perto distingo
Milhões de minúsculos insetos
Que voam inflamados e de pose bélica
No seu interior
A nuvem acaba por penetrar no âmago da minha razão
Sobrepondo-se aos afetos
Que me impregnam um entusiasmo recente
E é com aquele ruído de fundo
e disposto a seguir em frente
Que olhando de soslaio
Para uma borboleta que voa num círculo definido
E com suave magnitude
Que acaba por me extasiar
E é então que me pergunto:
- Porque é que, em vez dos gafanhotos, não me visita uma nuvem de borboletas?
Afago as flores brancas
Bravias
Que crescem livres no campo aberto
Mergulho naquele mar odorífico
E deixo-me envolver pelo suave ronronar
De três lindos gatinhos
Que se refugiam de um sol inclemente de verão
Descansando o seu ágil corpo
Na tranquila quietude de um leito de margaridas
Que compactas e bem juntinhas
Fazem uma só
E é neste quatro idílico
Que acabo comovendo a minha justeza
Do olhar mais sério
Que não se deixa penetrar
Pelas razões das conveniências
E que só conhece a linguagem
Pura do Amor;
E uma lufada de vento
que sopra pausado
Esguio e incandescente
Passa por cima da minha cabeça
E lá no alto leio o Mantra:
- Bem-me-quer…malmequer!