YUKIO MISHIMA
Vais-me dizendo,
Dizes-me…
E no derradeiro instante
Antes que possas perecer
Vens com a possibilidade:
A benefício de inventário
Mas logo,
Antes que as tuas exigências hereditárias se estabilizem,
Acenas com um “adeus”
E com uma magistral citação da Clarice Lispector
E num derradeiro esforço
Como uma guerra que travas interiormente
Resolves acabar!
Mas não te ficas simplesmente no acabar
Mas anuncias o derradeiro “fim”
Dramático
Do sangue que jorra de um dos olhos
Da lágrima embevecida
Que eclode no olho oposto
Mas o que me intriga
E concentra toda a minha atenção
É esse terço enrolado
Nas mãos eretas e apontadas ao céu
As mãos, essas que me mostras,
Parecem estar endiabradas e a rir
De mais uma das artimanhas Dele
Do mafarrico
E sentes que a tua hora parece estar a chegar
E queres, num derradeiro esforço,
Compartilhar com ele a tua dor
Mas bem na extremidade do terço
Que parece um prumo nas tuas mãos,
Emparceiradas uma na outra,
Eis que surge uma agonizante imagem
Que acaba por me provocar justo receio!
Uma caveira
Sim, uma caveira,
Descarnada,
Sem a pele que a cobriu em vida
Caveira
Despida, nua, monstruosa
Que mira com altivez
E parece pronta a mortificar-nos
Parece decidida
A levar deste mundo
Quem tanto gosta
De neste mundo viver e estar
E que tão gratas recordações
Guarda deste mesmo mundo:
Um mar delas
Que cintilam a cada passo
Como estrelas no céu
Mas como desistires de escrever?
Se a escrita está no teu ADN
Se a escrita, e só ela,
Te faz caminhar entusiasmada
Nessa vereda pejada de árvores
Que oxigenam a tua mente?
Mas, não me sai da cabeça,
Essa tua decisão
Que eu não sei se a levarás a efeito
Mas se a fizeres, mesmo contra a minha vontade,
Fá-lo, ao menos, como Mishima:
Seppuku!
Assim, tem mais impacto…